Desarquivada no Senado, proposta com novas regras para o seguro é criticada por representantes do setor
24, Abr. 2023
Para cinco entidades, projeto de lei afeta a liberdade de
negociação, a simplificação de produtos e padroniza garantias para riscos
desiguais
Por Jamille Niero – Fonte: InfoMoney
Desarquivado no Senado, no final de março, o Projeto de Lei
Complementar (PLC) nº 29/2017, que propõe novas regras para o setor de seguros
no país, recebeu duras críticas de cinco associações que alegam representar
mais de 100 empresas do mercado.
A nota conjunta foi divulgada à imprensa na quarta-feira
(12), mesmo dia em que o senador Jader Barbalho foi designado relator do
projeto na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), etapa atual de
tramitação da proposta no Congresso.
As entidades ABInsurtech (Associação Brasileira de
Insurtechs), Abecor (Associação Brasileira das Empresas de Corretagem de
Resseguros), ABGR (Associação Brasileira de Gerência de Riscos), ANRE
(Associação Nacional das Resseguradoras Locais) e Fenaber (Federação Nacional das
Empresas de Resseguros) argumentam que o PLC impactaria pontos como:
a liberdade de negociação;
a simplificação e a flexibilização de produtos;
além de padronizar “garantias para riscos naturalmente
desiguais”, ao equiparar “grandes segurados”, como uma plataforma de petróleo,
a “consumidores hipossuficientes”, como aqueles que contratam o seguro de
celular e estariam “já protegidos” pelo Código de Defesa do Consumidor.
Ainda de acordo com o comunicado, por ter sido originalmente
escrito há quase duas décadas (em 2004), o PLC conflita com outras leis já em
vigor, como a Lei Complementar nº 126 (de janeiro de 2017), que trata das
operações de resseguro, e a Lei de Liberdade Econômica (Lei nº 13.874, de 20 de
setembro de 2019).
Haveria também a possibilidade de inviabilizar o Open
Insurance, ecossistema digital ainda em implementação, uma vez que as entidades
apontam que a proposta não contempla, por exemplo, a contratação de seguros por
meios remotos.
Na prática, segundo representantes das entidades consultadas
pela reportagem do InfoMoney, se aprovado, o texto poderia encarecer
e inviabilizar a contratação de seguro e resseguro (o seguro da seguradora,
utilizado para dar mais capacidade nas coberturas) para diversas atividades
econômicas, além de limitar a inovação, dificultando ou mesmo impedindo a
criação de novos produtos e serviços mais modernos e adequados com a
necessidade do consumidor atual, que é quem poderia acabar sendo o mais prejudicado
financeiramente no fim das contas.
Para a ABGR, que reúne empresas e profissionais de
gerenciamentos de riscos, se aprovado o PLC poderá refletir na “perda de
competitividade para empresas brasileiras que exportam seus bens e serviços”,
já que “terão custos e condições de seguros mais desfavoráveis ou até
limitantes de sua operação”. A proposta, segundo a entidade, pode gerar uma
diferença muito grande em relação aos mercados de seguros de vários outros
países, como Estados Unidos, os que compõem a União Europeia, e até alguns
vizinhos, como Chile e Colômbia, que têm como “marca do setor a liberdade de
pactuação”.
Uma das principais reclamações da associação é a de tratar
todos os segurados da mesma forma, padronizando contratos e impedindo “que
grandes compradores de seguros possam ter condições e coberturas adequadas e
aderentes as suas operações”.
Como exemplo, o setor de energia elétrica seria um dos
grandes impactados, já que as empresas têm riscos muito complexos e operações
diferentes, afetadas por variáveis como região, políticas, entre outras.
Inclusive, em muitos contratos de concessão para companhias deste mercado, há a
exigência de contratação de seguros específicos, como para proteger o
patrimônio.
Na outra ponta, para as empresas como insurtechs, haveria
bastante impacto na inovação e na simplificação dos produtos. “Atuamos em
massificados, direto com o consumidor. Tentamos fazer produtos mais
simplificados, mais aderentes, com muita inovação e a proposta abre espaço para
judicialização e traz insegurança jurídica do processo”, alega a diretora
presidente da ABinsurtech, Barbara Possignolo.
Ela destaca entre os pontos mais prejudiciais do PLC a
questão do sinistro, que “pela forma como está escrito, poderia ser solicitado
para sempre, porque não traz a possibilidade de prescrição”, além de exigir
aviso por carta registrada em caso de inadimplência. “Imagina o custo disso pra
uma insurtech ter que notificar por esse formato, se toda a contratação [do
produto] é feita por meio remoto?”, ressalta. A necessidade de aprovação prévia
de produtos também inviabilizaria diversos negócios.
“Hoje, quando eu vou lançar um produto novo, eu só protocolo
na Susep [autarquia fiscalizadora do mercado de seguros] e já posso operar. A
Susep pode pedir ajuste no documento, mas ela não aprova o produto. E nem tem
corpo técnico para avaliar todos os pedidos com velocidade”. Para Barbara, o
setor deixou de avançar em inovação durante muito tempo justamente por conta de
uma regulação mais engessada, mas que já exige a transparência com o consumidor
na comunicação dos produtos e serviços.
A senadora Tereza Cristina (PP/MS) considera que o PL
29/2017, provavelmente, precisará ser debatido e atualizado. “Vamos ler com
muita atenção pois muita coisa pode ter mudado em 5 anos”, afirmou durante
evento da CNseg (Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência
Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização), em Brasília.
Roberto Santos, presidente do conselho da CNseg e da Porto
Seguro, concorda que alguns pontos do projeto precisam ser discutidos para
adaptá-lo às muitas mudanças que o setor de seguro passou nos últimos cinco
anos. “Todos os negócios foram influenciados pelos avanços da tecnologia, da
pandemia e da mudança de hábito de consumo. São mudanças significativas”,
declarou.
Para se ter uma ideia do tamanho do mercado impactado, segundo dados da própria CNseg, em 2022, os benefícios, indenizações, resgates, sorteios e despesas médicas e odontológicas pagas pelo setor atingiram a marca de R$ 454 bilhões. Considerando somente a saúde suplementar, a cifra é de R$ 234, 7 bilhões.
O InfoMoney procurou a Susep (Superintendência de
Seguros Privados), autarquia responsável pela fiscalização do mercado, e a
assessoria do senador Jader Barbalho, designado relator do PLC, e ambos não
retornaram aos questionamentos até esta publicação.
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