Universal Life:
solução que não sai do papel
Apenas
19% dos brasileiros são beneficiários do seguro de vida tradicional. Universal
Life segue em tramitação na Receita Federal
A
venda do seguro de vida no Brasil ainda continua sendo uma luta diária para os
corretores. Um estudo da Universidade Oxford em 2017 mostrou que apenas 19% dos
brasileiros têm o produto. O baixo volume de vendas serve de estímulo para que
mudanças sejam feitas. Para muitos, a saída seria a aprovação do Universal
Life, que tarda a acontecer.
Sandro
Cespes
O
mesmo estudo ressaltou que, globalmente, em média, o produto atinge 32% da
população de cada país, deixando o Brasil em uma situação desfavorável em
relação aos outros mercados. “A contratação de um seguro não depende
apenas da capacidade financeira, mas também da saúde e níveis de risco de cada
proponente”, declara Sandro Cespes, gerente de Produtos da Prudential do
Brasil. “Isso acaba sendo uma tendência para o acesso aos mais jovens, que
gozam de melhor saúde e têm melhores condições de contratação”. O executivo
acredita que “pessoas com mais idade têm mais dificuldade em serem aceitos por
uma decisão da própria seguradora”.
Já
Carlos André Meyer, corretor de seguros e diretor do ISB Brasil (Instituto
Superior de Seguros e Benefícios Brasil, antigo CVG-PR), diz que o maior
problema para a venda do produto está justamente na comercialização. “Uma frase
vem se repetindo durante os mais de 25 anos que estou neste mercado: ‘ninguém
acorda querendo comprar um seguro de vida’. Apesar dos esforços dos produtos
microsseguros ou seguros populares atingirem as classes menos abastadas, ainda
há muito a se fazer”, destaca. Ele ainda diz que nas classes com mais acesso a
educação e maior consumo, é comum ver os produtos de Vida contratados através
de bancos e lojas. “Esta situação, que não aproxima vendedor e cliente, gera
uma aversão ao seguro, uma vez que boa parte das vendas são ‘impostas’ mediante
a entrega de bens ou linhas financeiras”.
Carlos
André Meyer
Na
mesma toada, a líder de Consultoria em Vida da Aon Brasil, Anadir Mineiro,
também fala da precariedade da comunicação entre seguradora e segurado, mas
acrescenta que o mercado não desenvolve um produto tão atrativo e abrangente
para o consumidor. “A divulgação do seguro de vida precisa ser mais ampla e
esclarecedora, as pessoas não conhecem o produto, ficam limitadas à cobertura
de morte. O mercado precisa inovar, oferecendo serviços mais variados. As
coberturas tradicionais nem sempre atendem às necessidades dos interessados”.
“Os
próprios corretores não se preocupam em quebrar alguns paradigmas para o
segurado, que acha que esse seguro se limita apenas à morte”, complementa
Carlos Frederico, corretor de seguros e professor da Escola Nacional de Seguros
em Aracaju (SE). “A oportunidade de resgatar o dinheiro investido seria uma
grande cartada, ainda mais se nos depararmos com a possível reforma da
previdência, que pode desmotivar a contratação dos seguros individuais, pois o
trabalhador não tem a certeza se vai se aposentar”.
Quando
comparado ao seguro de vida tradicional, o Universal Life traria algumas
vantagens ao beneficiário, possuindo um ambiente complexo, com grande
diversidade de fatores que tratam de dinheiro capitalizado, cobertura de risco,
eventual inadimplência permitida, eventual variação de prêmio, além de um
possível acréscimo ou redução de cobertura.
Sandro
Cespes diz que o produto poderia reforçar tanto a proteção de curto quanto a de
longo prazo, mas lembra que o corretor terá que ser especializado. “Se o
produto for melhor trabalhado, vai abranger mais do que o ramo Vida, sendo
também uma ferramenta de proteção e planejamento financeiro para o consumidor.
Cabe aos profissionais de seguro conhecer o Universal Life de trás para
frente”, acrescenta.
Segundo
o diretor do ISB Brasil, esse é um modelo bem sucedido em outros países, mas
que deve ter melhores ajustes fiscais para ser atrativo ao consumidor. “O
Universal Life impulsionou o mercado de seguros nos EUA. No Brasil,
embora já exista nos planos das seguradoras especializadas, ainda não há
vantagem fiscal ou pelo menos igualdade com outros produtos de acumulação ou
investimentos. Há a urgente necessidade de equiparar o produto a outros que já
possuem melhores benefícios tributários. E isso passa pela regulamentação do
produto”, pondera.
Carlos
Frederico
“É
preciso entender que não podemos comparar o seguro de vida com a rentabilidade
de um plano de assistência médica, mas podemos garantir que uma boa gestão do
benefício vai abrir portas para administrar outros negócios dentro do mercado
de seguros”, comenta Anadir.
Reformas
Outros
fatores que impactaram diretamente o setor securitário foram as reformas
trabalhista e previdenciária. Se a primeira, aprovada em novembro de 2017,
deixou as empresas e empregados menos dependentes um do outro, estimulando o
trabalho informal, ampliando o peso das negociações entre empresas e sindicatos
ou empregados, permitindo que esses acordos se sobreponham ao legislado, a
última, parada em decorrência da intervenção militar no Rio de Janeiro, pode
elevar a idade da aposentadoria e estimular ainda mais a necessidade de se
explorar um modelo de capitalização.
Para
Anadir Mineiro, a reforma trabalhista representa uma grande oportunidade às
carteiras coletivas, mas as corretoras precisam estudar melhor as maneiras de
distribuir o produto. “As pequenas e médias corretoras ainda não estão
totalmente preparadas para administrar os planos de vida. Em muitos casos,
essas companhias não possuem um sistema eficaz para gerir a demanda e nem
detalhes sobre a documentação em caso de sinistro”. Ela ressalta que, com a
aprovação da reforma, a carteira traz grandes oportunidades, principalmente nos
seguros corporativos. “O seguro de vida é o segundo benefício mais oferecido
pelas empresas (94%), atrás apenas da assistência médica (99%) e à frente até
mesmo do vale refeição (79,6%) e vale alimentação (67,9%). Os benefícios ainda
são uma maneira de reter um trabalhador”, termina.
Na
contramão, Cespes acredita que a falta de vínculo empregatício pode, sim,
diminuir a incidência dos planos coletivos, porém, acredita que há oportunidade
para os pacotes individuais se alastrarem. “Os planos individuais com formação
de reserva matemática acabarão ganhando maior simpatia do cliente, que terá a
opção de, no futuro, desistir da cobertura e ainda contar o recebimento dos
valores provisionados pela seguradora para o pagamento do benefício. Esse será
o diferencial em prol dos seguros individuais”, opina.
Vida
Segundo
dados de 2017 da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi),
o ramo Seguro de Vida registrou R$ 13,69 bilhões em prêmios, o que representou
um aumento de 4,48% em relação ao acumulado de 2016, crescendo acima do Produto
Interno Bruto (PIB), que fechou o ano com alta de 1%. Mesmo assim, quando
comparado a outros ramos, o crescimento foi bem abaixo do esperado. Como
comparativo, o seguro prestamista cresceu 23,42%, o seguro viagem, 22,62% e o
seguro de vida resgatável – dotais – teve alta de 21,80%.
Os
seguros coletivos de empresas oferecidos em forma de benefícios aos
colaboradores, de sindicatos e associações de classes para adesão de seus
associados, responderam por 77% do total do resultado do segmento. Os seguros
individuais, contratados por pessoa física, representaram 23%.
“O seguro de vida não
é visto como um investimento, mas como um custo sem retorno. A questão é
cultural. O falecimento traz uma série de custos, com funerária, jazigo,
enterro, inventário. Em qualquer situação, é difícil lidar com a perda de um
ente querido, mas em uma situação financeira desfavorável, é muito mais
difícil”, salienta Anadir. Ela acrescenta que “esse tipo de seguro deve ser
encarado como um amparo para a família e uma possibilidade de recomeço”.
A
população de pessoas com mais de 60 anos no Brasil foi inferior a 10% durante
todo o século XX. Entretanto, na última década, esse perfil passou por
transformações. De acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), entre 2005 e 2015, a proporção de pessoas com
mais de 60 anos de idade cresceu em velocidade superior à da média mundial,
saindo de 9,8% para 14,3%. Isso significa que dos 207 milhões de brasileiros,
mais de 26 milhões estão acima dos 60 anos. A previsão é de que em 2027, menos
de 10 anos, essa fatia chegue a 37 milhões de pessoas.
“Nossa
natureza evita que pensemos no pior. Com a mudança demográfica, talvez produtos
‘em vida’ comecem a aparecer como os mais procurados. Os planos de saúde,
embora completos, possuem um custo nem sempre acessível”, analisa Carlos André
Meyer. “Caberá apenas ao mercado de seguros incrementar suas ações, apontar
produtos e soluções”, completa.
O
gerente de Produto da Prudential acredita que a penetração do seguro de vida no
País passa por uma questão de maturidade. Ele cita como exemplo os modelos de
PGBL e VGBL, que, para ele, levaram aproximadamente 20 anos para quebrar o
preconceito da população que viveu épocas de instabilidade financeira. “Os
produtos individuais de Vida deverão ser mais ‘user friendly’, porém não menos
complexos. A forma de abordar e explicar suas funcionalidades precisa ser mais
clara para que os clientes tenham o mesmo conforto, segurança e confiança para
contratar. Tem espaço para todos”, opina.
O
professor da Escola Nacional de Seguros aponta que o período eleitoral pode ser
um dos empecilhos para a aprovação do produto ainda em 2018. “Mesmo que
regulamentado, primeiro teríamos um período de maturação, para que empresas se
adaptassem ao produto e seguissem à risca o que seria passado pela Susep.
Apenas depois, teríamos um mercado desenvolvido e com coberturas diferenciadas.
As seguradoras vão precisar de tempo para aperfeiçoar o produto”.
A
passos curtos
A
Resolução CNSP Nº 344, que criou o produto Vida Universal no Brasil, depende
dos últimos ajustes que estão sendo feitos pela Receita Federal, mas segue sem
uma prévia de aprovação. A Susep prometia publicar a circular oficial para a
regulamentação do produto até abril de 2018, o que não aconteceu. Vale lembrar
que outros países da América Latina, como Chile, já comercializam o Universal
Life há mais de 15 anos.
Maike
Silva da Revista Apólice