Mercado precisa avançar em seguros sob medida e coberturas nat cat
Por Rodrigo Amaral - Fonte: Revista Risco Seguro Brasil
Fulvio Balmant (BASF) também crê que novo marco legal deve aumentar burocracia, mas com o tempo pode ser favorável para os compradores de seguros

Fulvio Balmant (à direita) durante o congresso da ABGR em 2023 (Crédito: Divulgação)
As seguradoras brasileiras fizeram progressos nos últimos anos na oferta de produtos sob medida para as empresas, mas continuam muito atrás de seus pares internacionais nesse quesito.
É o que diz Fulvio Balmant, head de Seguros para a América do Sul na BASF, que teme que as mudanças que vêm por aí nas regras para o mercado de seguros acentuem o engessamento das coberturas em oferta no país.
Em entrevista à RSB, Balmant expressou uma visão mais positiva do que a de outros compradores de seguros sobre o novo Marco Legal dos Seguros, que foi sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro.
Entidades como a Associação Brasileira de Gerência de Riscos (ABGR) e a Federação Nacional das Empresas de Resseguros (Fenaber) creem que a lei pode inibir a inovação e restringir o acesso à capacidade de resseguro global.
Mas Balmant considera que, ainda que a nova lei gere mais trabalho para os gerentes de riscos, ela também pode forçar as seguradoras a serem mais eficientes no processo de subscrição.
“A nova legislação tem o foco de proteger o lado do segurado, então, como segurado, eu a vejo com bons olhos. Mas, se ela for implementada tal qual está escrita, pode ser que o mercado segurador aumente o nível de burocracia e exija uma infinidade de informações durante os processos de subscrição e de sinistros.”
A nova lei aperta as regras para os processos de subscrição, determinando, por exemplo, que a seguradora tem que se manifestar sobre a cobertura em no máximo 30 dias e só pode pedir informações ao comprador duas vezes.
Sinistros de grandes riscos também terão que ser geridos dentro de um prazo a ser determinado pela Susep, mas que deve ficar entre 30 e 120 dias, de acordo com especialistas.
O temor é que, em tais condições, as seguradoras e resseguradoras se tornem mais conservadoras na hora de aceitar os riscos das empresas. No entanto, uma vez que o mercado se acostume às novas regras, que começam a valer no final deste ano, Balmant crê que o resultado das mudanças tende a ser positivo.
“Eu vejo com muito bons olhos a ideia de estabelecer prazos determinados para o processo de subscrição e o regramento dos sinistros. No começo, talvez seja um pouco mais sofrido, mas, no médio e longo prazo, isso tende a dar bons frutos”, diz ele.
Que siga o progresso
Para Balmant, é importante que o mercado continue evoluindo após a implementação das novas regras.
“Recentemente nós vimos um boom de novas seguradoras e corretoras abrindo operação no Brasil. Elas entendem que é um mercado que precisa ser desenvolvido e, por isso, aqui existem oportunidades de negócio. Mas o mercado global ainda está em outro patamar.”
Na visão dele, é muito importante que o mercado siga avançando na oferta de coberturas sob medida para as necessidades de cada empresa, algo vital para a transferência de riscos grandes ou complexos. A liberdade para que as partes negociem as coberturas sem interferência do regulador existe há muito tempo nos mercados globais, mas é uma conquista recente dos compradores de seguros brasileiros.
“No Brasil, a Susep parametrizou os produtos para alguns ramos de seguro. Mas no mercado internacional, o que existe é um acorde entre as duas partes. Daí a empresa pode negociar o que vai estar coberto e o que vai estar excluído”, observa Balmant.

De férias em Madrid em outubro, Balmant aproveitou para
participar da conferência bienal da FERMA (Crédito: Divulgação)
Em 2021, o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) baixou uma resolução liberando as negociações de clausulados entre seguradoras e clientes, mas Balmant considera que as coberturas continuam engessadas porque o mercado ainda está em fase de adaptação às apólices tailormade.
“As coberturas sob medida andaram muito pouco porque, até agora, os contratos automáticos de resseguro das seguradoras ainda não estão refletindo essa realidade. Cada vez que se precisa criar uma cobertura particular nova, é preciso que negociar e consultar muitas partes, o que inviabiliza o timing da negociação. Acaba virando um processo muito árduo para ter um produto que vai ser pouco alterado por uma cláusula particular ou outra.”
Capacidade de resseguro
Mas não é só a possibilidade de negociar clausulados que está levando os compradores para o mercado global de resseguro facultativo. Muitas vezes eles simplesmente não encontram alternativas entre os subscritores domésticos.
“O mercado brasileiro tem atendido às exigências das empresas localmente, mas até um certo volume de negócios. Se as capacidades e os volumes negociados são grandes, muitas vezes o mercado local não consegue acompanhar,” afirma Balmant.
“É por isso que agora ouvimos falar tantas vezes sobre os road shows em que segurados brasileiros buscam capacidade em outras regiões porque o mercado local não está atendendo.”
Críticos da nova lei alertam que ela pode restringir a liberdade de acessar o mercado global de resseguros, que foi tomando corpo gradualmente desde o fim do monopólio do IRB. Balmant torce para que isso não aconteça.
“Minha esperança é de que não vai se restringir a oferta de capacidade e voltar ao que a gente tinha anos atrás. Seria um regresso sem precedentes, pois o mercado de seguros cresceu muito desde a abertura. Mas a gente pode ter alguma dificuldade, inicialmente, para que o mundo se adapte ao Brasil, e também que o mercado se adapte às novas regras.”
Falta capacidade catastrófica
Ele cita as exposições catastróficas ligadas ao clima como um exemplo de risco para o qual o mercado está relutante em oferecer capacidade no momento.
“O mercado tem restringido acesso a essa capacidade em função das perdas que ocorreram nos últimos anos. Mas as empresas ainda têm que produzir seus produtos e mandá-los para seus clientes, independentemente da região onde eles estejam,” afirma Balmant. “Negociar termos favoráveis com as seguradoras tem se tornado um desafio para o gestor de risco.”
As enchentes que arrasaram o Rio Grande do Sul no ano passado ilustraram bem o desafio enfrentado pelos gerentes de riscos. Também puseram em evidência os baixos níveis de asseguramento contra esse tipo de evento.
“Eu tenho como fazer o melhor que eu posso para dentro do portão, e posso influenciar ativamente meus fornecedores e clientes. Mas é muito difícil para o risk manager encontrar soluções para esse risco em escala regional. Nesse caso, tem que ser uma solução elaborada a quatro mãos com o mercado segurador, e nesse momento as seguradoras estão evitando isso.”
A importância da gestão de riscos
A atitude mais restritiva das seguradoras é resultado do endurecimento global dos mercados de resseguros nos últimos anos. Em 2024, pipocaram sinais no exterior de que a situação está se tornando mais favorável aos compradores, e as renovações de janeiro 2025 já foram mais tranquilas. O ciclo, porém, tende a tardar um pouco mais para chegar ao Brasil.

Após trabalhar como subscritor e corretor, Balmant se dedica já
há três anos à gestão de riscos corporativos (Crédito: Divulgação)
Além disso, a corrente transformação do país em um mercado exposto a eventos catastróficos contribui para que a restrição do apetite das seguradoras por riscos de maior vulto continue em vigor. Balmant nota que o processo de subscrição está bastante rigoroso e que as inspeções de engenheiros de riscos dos subscritores se tornaram uma rotina cada vez mais frequente nas empresas brasileiras.
É por esse motivo que muitas empresas estão prestando mais atenção à gestão de riscos, e que os profissionais da área estão ganhando peso no mercado. Mas Balmant ressalva que esse processo não é homogêneo em todo o país.
“Eu vejo com bons olhos a evolução da gestão de riscos, mas está muito distante do ideal. É uma função de grande valia para as companhias, mas muitas ainda não entenderam isso.”
Ele nota que a função está ganhando espaço especialmente nos grandes centros, mas segue bastante ausente entre empresas espalhadas pelo interior do país. Muitas vezes, o responsável pelos seguros é o departamento de compras ou até mesmo o jurídico, e o trabalho especializado de análise, mitigação e transferência do risco é ignorado ou delegado a um corretor.
“Fora dos grandes centros, não é um gestor de riscos quem faz a contratação do seguro. É alguém que está ali para comprar uma apólice para atender uma necessidade do negócio, às vezes uma necessidade legal ou contratual com algum cliente ou fornecedor,” observa Balmant.
Mas ele ressalta que, com os processos de subscrição cada vez mais rigorosos, simplesmente cumprir a lei no que diz respeito à prevenção de riscos não é suficiente para assegurar as coberturas que uma companhia necessita.
“As frequências das visitas por parte das seguradoras têm aumentado, e os parâmetros exigidos são cada vez mais exigentes. A função do gerente de riscos é incorporar essas exigências dentro da operação da empresa”, diz.
“Cada vez mais é necessário implementar medidas de gestão de riscos que vão além do que é legalmente exigido para convencer o mercado a aportar capacidade.”
Balmant, que é membro do conselho da ABGR, chegou à gestão de riscos através do mercado de seguros, um caminho inverso ao que é feito por muitos profissionais do setor.
Formado em engenharia mecânica, ele começou sua carreira como subscritor na área corporativa de uma grande seguradora e, durante a pandemia de Covid-19, trabalhou em uma corretora global. Nos últimos três anos está desempenhando a função de risk manager.
A experiência nas três principais atividades do mercado lhe ajuda a ter uma visão dos desafios enfrentados pela gestão de riscos.
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