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Ressarcimento e Suas Nuances

26, Nov. 2021

Seguradoras não podem pleitear ressarcimento apenas por presunção

Fonte: blog do rocha

O artigo 786 do Código Civil estabelece que a companhia de seguros, ao efetuar uma indenização, sub-roga-se nos limites do valor efetivamente desembolsado, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano. A indenização a que o respectivo artigo se refere, vinculado a um sinistro coberto e amparado pela apólice contratada, permite a seguradora buscar o ressarcimento do valor pago a seu cliente. Porém, para exercer o direito da sub-rogação, primeiramente é preciso identificar o causador do dano e provar a sua responsabilidade. A lei não admite o direito de agir apenas por presunção ou suposição, é necessário a individualização da conduta, descrição do dano e comprovação do nexo de causalidade entre a conduta do causador do dano e o sinistro indenizado.

Em se tratando do seguro de transporte internacional, não havendo a clara definição do culpado pelo prejuízo que resultou a indenização, a seguradora não pode simplesmente atribuir culpa ao agente de cargas alegando a responsabilidade objetiva e de resultado. O agente de cargas opera meramente nos serviços de agenciamento, sem executar efetivamente o transporte, portanto, não há que se presumir qualquer vínculo solidário com o transportador pelos danos causados à carga, especialmente, em razão da interpretação e aplicação da solidariedade legal do art. 756 do Código Civil.

Perante as leis brasileiras, o agente de cargas tem responsabilidade de meio, ou seja, não tem a obrigação de garantir o sucesso de operação e não responde por um resultado certo. Mas, isso não significa isenção de responsabilidade, o agente de cargas tem a obrigação de empregar seus conhecimentos técnicos e experiência na prestação de serviços com a escolha de prestadores de serviços com reconhecida capacidade técnica para a execução dos serviços propostos, visando a entrega da mercadoria em perfeitas condições.

Na hipótese de ações regressivas promovidas pelas seguradoras, o agente de cargas precisa de uma boa assessoria jurídica capaz de demonstrar que desempenhou seu trabalho corretamente e empregou todos os recursos possíveis para o alcance do objetivo da operação, como também não agiu com culpa ou dolo e assim afastá-lo do polo passivo da ação.

Um caso que serve para mostrar o equívoco da seguradora se desenvolveu no tratamento de um sinistro ocorrido em julho de 2020 no aeroporto de Shanghai Pudong na China. O Boeing 777 da Ethiopian Airlines pegou fogo enquanto carregava cargas que seguiria para São Paulo. Na ocasião, o acidente foi mundialmente divulgado e a companhia aérea assumiu a responsabilidade pelo ocorrido. Nesse episódio, um dos importadores brasileiros que teve perda total de suas mercadorias foi ressarcido por sua seguradora, e no pleito de ressarcimento em regresso, seus advogados tiveram a ousadia de citar que concluíram que o agente de cargas brasileiro que coordenou a importação foi o causador dos danos na carga. Este exemplo, entre muitos outros, retrata o despreparo de algumas empresas em prejuízo do consumidor de seguros, razão da existência das seguradoras.

Embora o agente de cargas não possua responsabilidade de resultado, quando é acionado por prejuízos causados por culpa de seus subcontratados, precisa se defender. Não pode simplesmente esperar e depender, exclusivamente dos Tribunais, incluindo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a aceitação da tese de irresponsabilidade no caso de prejuízos reclamados. Esta situação reforça a importância da contratação do seguro de responsabilidade civil e erros e omissões, que cobre uma eventual decisão de responsabilização em ações indenizatórias promovidas pelos seus próprios clientes, terceiros, e em especial, ações regressivas de ressarcimento de companhias de seguros. Este seguro oferece também garantias para outros importantes riscos a que a atividade está exposta e sujeita, tais como: responsabilidade por perdas ou danos causados às cargas; despesas de salvamento; adiantamento para contribuições de avaria grossa; despesas adicionais de redirecionamento da carga; despesas adicionais de remoção e descarte de cargas danificadas; despesas de quarentena; despesas relacionadas à insolvência do transportador marítimo; responsabilidade civil por danos causados a terceiros; poluição, contaminação e vazamento súbitos; custos de defesa em juízo cível; e responsabilidade civil pelas perdas financeiras causadas aos embarcadores seus clientes.

A sub-rogação colabora com a higidez e equilíbrio econômico da atividade de seguros, mas quando exercida incorretamente, depõe contra a imagem do mercado segurador.

Autor: Aparecido Rocha / insurance reviewer

Painel moderado por Marcio Coriolano reúne especialistas para discutir o resseguro

CQCS

Um painel dedicado ao resseguro demonstrou seus avanços, a relevância na cadeia de seguros, além de explicitar questões pouco conhecidas pelos segurados que têm seus riscos partilhados entre seguradoras e resseguradoras, inclusive o poder de interferência nas regulações de sinistros. O tema foi tratado no último painel, do segundo dia (24,) do II Congresso Internacional de Direito do Seguro (CJF-STJ) e VIII Fórum José Sollero Filho (IBDS), que foi moderado pelo Presidente da Confederação Nacional das Seguradoras – CNseg, Marcio Coriolano e presidido pelo Ministro do STJ Ricardo Villas Bôas Cueva. Participaram também o professor Luis Alberto Meza Carbajal, da Universidad Nacional Mayor de San Marcos, no Peru; Paulo Botti, sócio-fundador da Terra Brasis Resseguros; e a advogada Inaê Siqueira de Oliveira, mestre em Direito Civil pela USP.

Marcio Coriolano fez um breve balanço da trajetória do resseguro no País. Em 2020, um ano difícil dada a pandemia, o Presidente da CNseg destacou que os negócios cedidos a resseguradoras manteve a média dos anos anteriores, que oscila de 8,5% a 10% dos prêmios totais das seguradoras (excluindo Saúde e Previdência). A participação permanece estável, ainda que o mercado de seguros tenha crescido cinco vezes e meia entre 2010 e 2020.

Com esses números, Coriolano assinalou que a concorrência ampliada no setor produziu uma desconcentração da produção de prêmios nas mais variadas carteiras. Antes, destacou, seis companhias concentravam o mercado há dez anos. Hoje, há presença de empresas nacionais e estrangeiras nos diferentes ramos e modalidades, beneficiando o consumo e a penetração do seguro. Por fim, ele lembrou que a flexibilização das normas de livre mercado no seguro e resseguro ocorreu em ritmo diverso. A do mercado de seguros ocorreu em 1996 e a de flexibilização do resseguro foi regulamentada quase 13 anos depois.

Paulo Botti foi um dos painelistas e, na sua exposição, demonstrou preocupação com os crescentes repasses ao exterior dos grandes riscos brasileiros. Ele vê nesse processo um gradual enfraquecimento do mercado de seguros. Para ele, isso é fruto da evasão das seguradoras nacionais do segmento de grandes riscos nos últimos anos- o foco delas é hoje o varejo massificado – abrindo caminho para retenções de riscos vultosos decrescentes no mercado brasileiro.

No Brasil, país cuja abertura do resseguro vai completar em janeiro próximo mais um aniversário, com a regulamentação da Lei Complementar 126/2007, o modelo previa, inicialmente, a retenção de riscos no mercado local – 50% do prêmio excedente ofertado – mas a partir de 2017 a liberdade plena das operações se consolidou, encerrando a cessão obrigatória.

De lá para cá, as seguradoras locais, inclusive algumas multinacionais sem tecnologias para atuar em grandes riscos, cedem negócios e espaços a conglomerados internacionais, com destaque para operações intragrupos e repasses de responsabilidade diretamente ao exterior, diz Paulo Botti.

Segundo Botti, este movimento aumenta a aceitação e regulação de sinistros no exterior, sendo acompanhado por novas pressões por mais flexibilidade dos resseguros. Na avaliação dele, a consequência disso é um futuro desafiador, acenando para a perda de sentido estratégico das resseguradoras locais, que reduzem sua competitividade pelo peso de impostos, algo que tornará mais racional ter sua base, inclusive no caso do IRB, no exterior.

Um futuro que já parece, aliás, realidade no Peru, onde grande parte dos negócios de riscos vultosos são repassados ao exterior, e as companhias de seguros atuam como meras corretoras, no entender do professor Luis Alberto Meza Carbajal. Ele detalhou de forma crítica as regras que regulamentam as operações de resseguros em seu país, assinalando que o marco do órgão de supervisão do mercado peruano coloca em risco seguradoras e segurados, ao incluir, em seu escopo, atribuições que, a rigor, deveriam ser do Legislativo e ignorar leis que tratam da proteção do consumidor e de abuso econômico. Hoje, segundo Carbajal, parcelas significativas de capitais segurados de empresas públicas e privadas estão resseguradas no exterior e longe da jurisdição peruana, algo que pode impor toda sorte de riscos aos segurados, como prazos de regulação excessivamente alargados e indenizações aquém das perdas, por exemplo.

A advogada Inaê Siqueira de Oliveira propôs novas leis que deem mais transparência às relações entre seguradoras e ressegurados, incluindo informações aos segurados sobre repartição de seus riscos entre esses dois pares do mercado. Ela manifestou clara preocupação com as chamadas Cláusulas de Assistência, Cooperação e Controle de Sinistros (CCCs), que afetam a relação entre segurador e ressegurador e podem produzir desvios nos cursos das liquidações de sinistros.

Além de ver de forma crítica a presença do ressegurador na regulação – este expediente é mais comum em cessões de grandes riscos – Inaê entende que as CCCs abrem espaços para abusos, tendo em vista que, a qualquer momento, as resseguradoras podem assumir o controle total das investigações, perícias e liquidações de quaisquer sinistros notificados, tornando moroso ou incerto o pagamento das indenizações. A seu ver, novas legislações são importantes para cobrir os vácuos legais dessa relação contratual, afastar o risco inesperado de recusa do cumprimento de obrigações assumidas e ampliar a segurança jurídica do resseguro brasileiro.

O ministro Ricardo Cueva elogiou o notório saber dos participantes do painel, afirmando que as apresentações colaboraram para tornar as operações de seguros e resseguros mais bem entendidas pelo Judiciário.

O II Congresso é organizado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CJF) e pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS), com apoio do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Pier Seguradora apoia organização social para qualificar jovens negros

Seguradora se une à Programadores do Amanhã e já tem aluna formada trabalhando na empresa

SonhoSeguro

A Pier anunciou apoio ao projeto social Programadores do Amanhã, que tem o objetivo de qualificar, fortalecer e dar protagonismo a jovens negros e negras que desejam ingressar no mercado da tecnologia, de forma gratuita, sendo que 75% das turmas, são formadas pelo público feminino. A seguradora, por sua vez, visa contratar alunos formados no projeto e, inclusive, a primeira contratação de uma aluna do Programadores do Amanhã foi feita pela Pier.

O programa é destinado a jovens negros da escola pública que estejam cursando o 2º ou 3º ano do ensino médio e oferece formação técnica que vai da teoria à prática de desenvolvimento web e apps. O projeto também conta com formação na língua inglesa, atendimento psicológico, além de mentorias com diversas participações em atividades que visam o desenvolvimento pessoal e profissional. O programa também fornece notebook e internet para que os alunos tenham acesso às ferramentas necessárias no decorrer do curso, que é realizado de forma online.

Com prazo final de inscrição em 26 de novembro, os jovens que desejarem entrar para a nova turma do Programadores do Amanhã deverão passar por um processo seletivo. São 50 vagas disponíveis para a primeira turma de 2022, com aulas iniciando no mês de janeiro e indo até dezembro. Todas acontecerão de forma remota, dando a chance para que pessoas de qualquer parte do Brasil possam se inscrever. A expectativa é que o projeto receba pelo menos 500 inscrições.

“Para a Pier faz sentido, enquanto uma empresa que demanda esse tipo de profissionais, apoiar a formação de jovens para o mercado de tecnologia. Com a alta demanda e a escassez de profissionais da área, o incentivo nos estudos e contratação destes alunos são fundamentais e vão ao encontro do nosso propósito. Além disso, o apoio à educação é mais do que uma responsabilidade social, é acreditar que o futuro começa agora”, afirma Juliana Lazzari, líder de talentos e aquisições da Pier.

A Pier contratou uma aluna que fez parte da primeira turma formada pelo projeto. Ela tem 19 anos, mora na cidade de Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte, e hoje ocupa a posição de Engenharia de Software na empresa. Para a próxima turma, a seguradora custeou por completo o estudo de mais 5 alunos e visa empregar outros profissionais formados pela organização.

“Ter empresas referências em tecnologia e inovação como a Pier como apoiadoras do Programadores do Amanhã mostra a importância da diversidade nos ambientes de criação de produtos disruptivos. Além disso, mostra a importância de criarmos pontes para que jovens talentos possam ocupar essas posições. A Pier entende e valoriza a nossa missão e juntos vamos impactar a vida de muitos jovens espalhados pelo Brasil.”, comenta Cleber Guedes, idealizador do programa.

A seguradora nasceu de forma digital e encontra alguns desafios quando o assunto é contratar profissionais de tecnologia, devido à concorrência com o mercado exterior, além de cada vez mais startups demandando dessa especialização profissional.

“Sabemos as dificuldades que muitos jovens enfrentam para conseguir se especializar e ingressar no mercado profissional, então por que não ajudar nesta formação? Enxergamos na Programadores do Amanhã a possibilidade de resolver duas grandes questões: acesso à formação de jovens da periferia e capacitação de talentos para o mercado de trabalho Tech.”, finaliza Juliana.

Prevenção e uso de dados ajudam a reduzir custos das operadoras

Modelos de assistência podem ser alívio para novos gastos do setor, segundo especialistas

Folha de S.Paulo

Para garantir maior acesso aos planos de saúde, as operadoras devem rever os modelos de assistência, pensando no melhor cuidado para o paciente. Assim, é possível saber como gastar melhor os recursos.

Isso é o que defende Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde, que representa 15 grupos de operadoras e seguros privados. Ela foi uma das participantes da 4ª edição do Seminário Saúde Suplementar, promovido pela Folha na última segunda (22).

Em abril deste ano, o número de beneficiários em planos privados superou a marca de 48 milhões, alcançando o maior patamar desde 2016, conforme dados da ANS (Agência Nacional de Saúde).

Valente diz que o setor não é concorrente do SUS e que ele serve para aliviar a demanda da rede pública. 'A pandemia mostrou que é muito importante atuarmos de forma integrada [com o SUS]. Isso beneficia a todos.'

Apesar do crescimento no número de usuários, os planos enfrentam desafios para lidar com os custos. Entre os motivos estão a mudança de perfil das doenças, o aumento do uso da tecnologia e maior longevidade da população.

Uma das alternativas é a gestão ativa de saúde, afirma Pablo Cesário, responsável pelo relacionamento com o Poder Executivo na CNI (Confederação Nacional da Indústria). Com o método, as operadoras traçam um perfil do cliente para agir de forma precoce em relação às doenças que ele possa desenvolver.

'Controle diabetes e pressão alta e 80% dos seus gastos serão minorados. A melhor forma de tratar a doença é não tê-las.'

Para que isso se torne mais frequente, seria necessário promover uma ampliação nos sistemas de informação, de acordo com Francisco Vignoli, médico e sócio-diretor da consultoria B2 Saúde & Bem Estar. Segundo ele, as empresas precisam investir em transparência de dados.

Apostar no uso de dados é o que tem sido feito no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo. A unidade Vergueiro, na zona sul da cidade, tem investido em um modelo de previsibilidade.

Os custos são pré-definidos pelo prestador e a operadora. Caso o valor de um procedimento seja maior do que o combinado, o hospital arca com o excesso. Mas, quando as despesas são menores, a unidade fica com a diferença.

José Marcelo de Oliveira, diretor-presidente do hospital, diz que foi criada uma integração das informações. Os dados do paciente formam um histórico, que pode ser usado sempre que necessário. Com isso, é possível estimar de forma mais precisa as despesas a serem gastas.

Iniciativas de clínicas e hospitais para diminuir custos devem ser reguladas, diz Cesário, da CNI. Assim, é preciso que haja transparência no uso de dados dos pacientes.

Modelos verticalizados, nos quais há investimento das operadoras em rede própria, também reduzem despesas. Entretanto, Valente diz que o usuário tem mais liberdade quando há mais opções para escolher, embora os dois sistemas sejam bons.

Pandora Papers: urgência da tecnologia para identificar titularidade

Monitor Mercantil

Na semana passada, o Senado do Chile rejeitou o pedido de impeachment do presidente Sebastián Piñera, acusado de conflito de interesses na venda de um projeto de mineração por meio de um paraíso fiscal. O ato foi a repercussão mais recente da investigação jornalística conhecida como Pandora Papers, que revelou documentos confidenciais de 14 escritórios de advocacia especializados na abertura de empresas em países como Panamá, Ilhas Virgens Britânicas e Bahamas. Resumidamente, a iniciativa tornou conhecidas as fortunas secretas de algumas das pessoas mais influentes e conhecidas do mundo, incluindo ministros e outras autoridades brasileiras.

Na prática, ao abrir essa Caixa de Pandora, os profissionais de imprensa conseguiram apenas dar nomes e imagens que tornaram real a sensação já presente no imaginário popular há muito tempo. Tanto que, ao divulgar uma nota referente ao assunto, o Grupo de Ação Financeira contra Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (Gafi) diz que ocultar os verdadeiros proprietários de estruturas corporativas, fiduciárias e outras estruturas, e aqueles que as controlam, é uma técnica comum para camuflar lucros ilícitos.

A entidade afirma que mais de 200 países se comprometeram a exigir que suas instituições financeiras e não bancárias, como advogados, contadores e agentes imobiliários, identifiquem e verifiquem as informações de beneficiários finais de empresas formadas ou operando em suas jurisdições. Apesar disso, em mais de 100 avaliações mútuas, foi detectado que apenas um terço dos países possui leis e regulações relacionados à transparência de pessoas e arranjos jurídicos que cumprem os padrões do Gafi. Pior do que isso é o fato de que, segundo o órgão, apenas 10% destas nações tomam medidas efetivas para garantir a transparência da empresa e a identificação da titularidade real de arranjos fiduciários.

oda essa falta de preocupação com o tema permite que a chamada indústria das offshores impeça um melhor desempenho, principalmente dos países em desenvolvimento, em relação à qualidade de vida de suas populações. Segundo um estudo realizado pela Rede de Justiça Fiscal (Tax Justice Network), organização independente que faz campanha por mudanças nos sistemas tributários globais, o volume de dinheiro que o Brasil deixou de arrecadar somente em 2020 em impostos não pagos por multinacionais e milionários que fazem uso de paraísos fiscais seria suficiente para viabilizar o Auxílio Brasil de R$ 400 que o governo vem buscando formas alternativas para proporcionar às famílias carentes.

O mesmo estudo informa que, em todo o mundo, foram perdidos cerca de US$ 483 bilhões (R$ 2,6 trilhões) em impostos no ano passado divididos entre transferências legais ou ilegais de lucros de multinacionais para paraísos fiscais e sonegações praticadas por milionários que escondem ativos e rendimentos não declarados no exterior.

Diante de números tão impactantes, o Gafi faz um verdadeiro apelo por padrões globais mais rígidos, no sentido de promover a transparência das informações de beneficiário final e o uso mais eficaz dessas informações para responsabilizar aqueles que se escondem atrás do véu corporativo ou outras estruturas.

Ao que parece, a inexistência destes padrões se deve muito mais à falta de vontade política do que à escassez de instrumentos que permitam uma claridade maior nos bastidores deste tipo de transação. Existem legaltechs, por exemplo, que trabalham com ferramentas habilitadas para fazer mineração de dados e crawling, permitindo pesquisar em minutos junto a Google, Dados Cadastrais, sites da ONU, Ofac, Interpol e outras instituições, apontando com precisão o envolvimento de pessoas e empresas em casos de fraudes, corrupção, lavagem de dinheiro, terrorismo, crimes ambientais ou emprego de mão de obra escrava e infantil, entre outros problemas.

Não seria nada difícil adaptar estes instrumentos para criar barreiras visando inibir a utilização de fluxos financeiros ilícitos. Essa iniciativa poderia ser uma resposta bem mais rápida aos desafios da promoção de um crescimento econômico sustentável das nações do que os malabarismos orçamentários que, na maior parte das vezes, são soluções apenas paliativas que acabam gerando mais problemas do que benefícios.

Autor: Alexandre Pegoraro é CEO do Kronoos

Brasil corre risco de nova onda de covid como a Europa?

Da BBC News Brasil

Será que o aumento recente de casos, hospitalizações e mortes por covid-19 na Europa vai se repetir no Brasil? E o que pode ser feito para evitar uma nova onda por aqui?

Entidades alertam que, se nada for feito, Europa terá 700 mil mortes por covid-19 durante os próximos três meses© Fornecido por BBC News Entidades alertam que, se nada for feito, Europa terá 700 mil mortes por covid-19 durante os próximos três meses

Essas são as perguntas que epidemiologistas, médicos e pesquisadores em saúde pública brasileiros mais ouviram nos últimos dias.

De forma geral, a resposta deles é que precisamos entender os momentos distintos da crise sanitária em cada lugar, mas podemos tomar alguns cuidados para que um cenário ruim no exterior não seja "importado" para cá — como, aliás, aconteceu com as ondas anteriores.

"Muita gente compara o que está acontecendo em partes da Europa com o que pode acontecer por aqui. Não é tão simples assim", avalia o estatístico e pesquisador em Saúde Pública Leonardo Bastos, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

"Na minha opinião, não precisamos nos preocupar no curto prazo com essa onda europeia. Já no médio e longo prazo, a coisa pode mudar de figura."

A situação na Europa

Após uma queda e uma estabilização de casos e mortes por covid-19 entre abril e setembro, a Europa começou a ver um novo aumento a partir de outubro.

Em novembro, essas estatísticas explodiram e confirmaram uma nova onda da pandemia por lá.

Isso tem a ver com uma série de fatores, como a circulação de variantes mais transmissíveis, como é o caso da Delta, e a resistência às vacinas por parte da população de alguns países.

Alguns avaliam que também houve uma liberação prematura das restrições, especialmente o abandono do uso das máscaras.

Vale notar que a situação varia bastante de país para país. Nas nações com a campanha de vacinação mais avançada, caso de Portugal e Dinamarca, a taxa de mortalidade das últimas semanas segue bem mais baixa em comparação com os locais onde a cobertura segue muito abaixo do ideal, como Bulgária e Romênia.

Em uma projeção divulgada na terça-feira (23/11), a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou que, se nada for feito, a Europa pode contabilizar cerca de 700 mil mortes pela doença durante a temporada de inverno, que começa em dezembro. Até o momento, o continente tem cerca de 1,5 milhão de óbitos pela covid-19.

A OMS também afirmou que parte desses óbitos pode ser evitada com o reforço de algumas ações básicas: o avanço da vacinação, o uso de máscaras e a prevenção de aglomerações.

"Para convivermos com o vírus e continuarmos com nossas rotinas, precisamos de uma abordagem que envolva as vacinas e as demais medidas", discursou Hans Kluge, diretor regional da OMS na Europa.

"Todos nós temos a oportunidade e a responsabilidade de ajudar a evitar essa tragédia desnecessária e a perda de vidas, limitando os abalos à sociedade e à economia durante o inverno."

De acordo com a OMS, a Europa voltou a se tornar o epicentro da pandemia de covid-19© Getty Images De acordo com a OMS, a Europa voltou a se tornar o epicentro da pandemia de covid-19

Representantes do Centro Europeu de Controle e Prevenção de Doenças (ECDC) fizeram um alerta parecido.

Em um Num posicionamento oficial divulgado na quarta-feira (24/11), a entidade alertou para o alto risco de um impacto da covid-19 no continente ao longo dos próximos meses.

A diretora do ECDC, Andrea Ammon, afirmou categoricamente: os governos de cada país devem acelerar a vacinação, administrar doses de reforço nos adultos e reintroduzir as medidas restritivas.

"Essas três ações devem acontecer já. Não é uma questão de escolher apenas uma delas", alertou.

A agência não entende, por ora, que há a necessidade de lockdowns nacionais, mas sugere a volta de políticas públicas, como o uso de máscaras, o incentivo a trabalhar de casa, a manutenção de uma distância segura entre as pessoas e a redução das interações sociais.

A situação no Brasil

Após um primeiro semestre bastante complicado, os números da pandemia entraram em queda em todo o país.

Nas últimas semanas de novembro, as médias de casos, hospitalizações e óbitos por covid no Brasil alcançaram os índices mais baixos desde que começaram a ser medidos, em abril de 2020.

De acordo com os especialistas, isso se deve em parte à onda devastadora do primeiro semestre, que infectou muita gente e, por consequência, gerou um nível de imunidade considerável entre os que sobreviveram.

O respeito ao uso de máscaras e a manutenção de algumas medidas e políticas públicas, que mantiveram estabelecimentos com operação reduzida por boa parte do ano, também contribuíram.

Por fim, foi crucial a adesão do povo à vacinação. No momento, 61% dos brasileiros já estão totalmente imunizados.

"Isso foi determinante para a gente ter um maior controle sobre a pandemia", considera a epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo.

Vacinação no Brasil demorou um pouco mais para começar, mas contou com grande adesão das pessoas para avançar rapidamente© Fornecido por BBC News Vacinação no Brasil demorou um pouco mais para começar, mas contou com grande adesão das pessoas para avançar rapidamente

Essa transformação no cenário pandêmico fez com que recentemente muitas cidades e Estados brasileiros aliviassem as restrições e chegassem a anunciar até a liberação do uso de máscaras, movimento parecido ao que foi feito na Europa meses atrás.

E essa é justamente uma das ameaças ao futuro da pandemia no Brasil.

À deriva

Na opinião de Bastos, da Fiocruz, a comparação entre o que acontece no Brasil e na Europa não é justa por causa de uma diferença fundamental entre os dois lugares: a realização de testes para detectar os casos leves de covid-19.

Nosso país não desenvolveu como outras partes do mundo um amplo programa de testagem, capaz de identificar os pacientes com sintomas iniciais ou menos graves, que não exigem uma avaliação médica.

A média móvel de casos diários de covid-19 na Europa (linha verde) atingiu seu maior índice desde o início da pandemia. A comparação com o Brasil (linha laranja) deve ser vista com cautela, pois aqui não realizamos a testagem em massa e o diagnóstico de casos leves e sem sintomas© Fornecido por BBC News A média móvel de casos diários de covid-19 na Europa (linha verde) atingiu seu maior índice desde o início da pandemia. A comparação com o Brasil (linha laranja) deve ser vista com cautela, pois aqui não realizamos a testagem em massa e o diagnóstico de casos leves e sem sintomas

"No Brasil, as estatísticas sobre os quadros de covid leves são pobres, ruins e subnotificadas", diz o pesquisador.

"Os dados mais confiáveis que temos são de hospitalização e mortes por SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave]."

E aqui vale uma explicação breve sobre a evolução da doença: a infecção com o coronavírus demora até 14 dias para dar sintomas.

Após os incômodos iniciais, o quadro pode se agravar e exigir uma visita ao hospital nas duas semanas seguintes.

E, caso exista a necessidade de internação, o paciente pode ficar na enfermaria ou na UTI por cerca de duas a quatro semanas até se recuperar (ou morrer).

Ou seja: o período entre a infecção e o desfecho pode chegar a dois meses.

"Essa falta de dados sobre os casos leves faz com que o Brasil esteja sempre monitorando o que aconteceu no passado, com semanas de atraso", avalia o cientista da computação Jones de Albuquerque, do Departamento de Estatística e Informática da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Em outras palavras, a atual melhora nos índices reflete uma queda importante na transmissão do coronavírus ocorrida em outubro. E não temos a menor ideia de como está a situação de novos casos agora.

Monitorar casos leves é importante, porque são justamente essas infecções que fazem o vírus circular e geram toda uma sequência de eventos que cria as novas ondas da pandemia.

Aos poucos, a transmissão aumenta em escala geométrica e atinge os não vacinados ou os que foram imunizados há muitos meses.

Isso eleva o risco para a parcela mais vulnerável às complicações da doença, que podem ter de ficar internados e correm risco de morrer.

Em última análise, essa maior procura leva o sistema de saúde à saturação, com falta de leitos, profissionais e insumos.

É justamente o cenário que se desenrola na Europa com a nova onda — e que pode ser evitado (ou minimizado) no Brasil.

E a vacinação?

Mas como explicar esse agravamento da pandemia num momento em que as campanhas de imunização avançam em muitos lugares, inclusive no continente europeu?

É importante lembrar que as vacinas em uso foram desenvolvidas com um objetivo principal: diminuir a taxa de hospitalizações e mortes.

Elas até reduzem um pouco a transmissão do coronavírus, mas esse não é seu principal foco.

"E foi justamente isso o que aconteceu: a vacinação freou os casos mais graves", esclarece o médico José Luiz de Lima Filho, do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami Lika, da Universidade Federal de Pernambuco.

E mesmo agora, com a Europa batendo recordes de novos casos por semana, as taxas de hospitalizações e óbitos pela doença por lá seguem num patamar mais baixo em comparação com as ondas anteriores.

É um sinal claro de que as vacinas funcionam para aquilo que elas foram desenvolvidas, principalmente quando uma parcela maior da população recebeu as suas doses.

Mortes por covid-19 na Europa (linha verde) até subiram, mas estão em patamares mais baixos em relação às ondas anteriores. Brasil (linha laranja) teve pico no primeiro semestre de 2021, mas vive momento bem melhor agora© Fornecido por BBC News Mortes por covid-19 na Europa (linha verde) até subiram, mas estão em patamares mais baixos em relação às ondas anteriores. Brasil (linha laranja) teve pico no primeiro semestre de 2021, mas vive momento bem melhor agora

Mesmo assim, é esperado que ocorra esse aumento nas internações e nas mortes num período de agravamento: entre milhões de infectados, uma parcela deles, infelizmente, desenvolverá as complicações típicas da enfermidade.

Essa parcela é reduzida com a vacinação, mas ela continua a existir (até porque nenhuma vacina é 100% eficaz).

O que o momento europeu ensina ao resto do mundo, acreditam os especialistas, é que não dá pra abandonar as demais medidas preventivas (máscaras, distanciamento físico, etc.) subitamente, enquanto uma parcela considerável da população ainda não foi imunizada.

Essa observação se aplica ao Brasil: cerca de 40% das pessoas ainda não estão devidamente vacinadas. Isso representa uma enorme massa de suscetíveis para uma infecção pelo coronavírus.

Na Europa, países com uma taxa de vacinados similar ou até superior à nossa, como Alemanha e Áustria, se encontram atualmente em uma situação complicada.

Para Lima Filho, a comunicação feita sobre as vacinas contra a covid-19 foi equivocada. "As pessoas acreditam que estão totalmente protegidas após as duas doses, não precisam mais usar máscaras e podem se aglomerar", diz o médico.

"Esse comportamento faz aumentar a taxa de transmissão viral e coloca em risco toda a sociedade."

O que pode ser feito agora?

Com as evidências disponíveis, não dá para afirmar categoricamente que a nova onda da Europa também avançará Brasil adentro.

No entanto, os pesquisadores entendem que é possível tomar algumas precauções para diminuir o risco de que isso se concretize no início de 2022.

"E o primeiro passo é aumentar obrigatoriamente a fiscalização nas fronteiras, com testagem de todo mundo que entra no país por portos, aeroportos e países vizinhos", pontua Lima Filho.

Um programa amplo de testagem, que consiga detectar os casos leves e assintomáticos, também é essencial.

"Poderíamos ter unidades sentinela de casos suspeitos de covid-19, como acontece com o monitoramento da dengue, por exemplo. Quando a prefeitura percebe um aumento repentino numa região, ela pode enviar uma equipe ao local para investigar e fortalecer as ações preventivas ali para que o problema não se espalhe", sugere Bastos.

Testes com swab (haste semelhante a cotonete) costumam detectar presença do vírus nos primeiros 12 dias da infecção© Fornecido por BBC News Testes com swab (haste semelhante a cotonete) costumam detectar presença do vírus nos primeiros 12 dias da infecção

Como a experiência europeia reforça, também não é hora de abandonar completamente as máscaras ou promover aglomerações em locais fechados.

A vacinação precisa avançar mais — inclusive com a aplicação de uma terceira dose em toda a população adulta ao longo dos próximos meses, como anunciado pelo Ministério da Saúde recentemente.

A antecipação da dose de reforço no Brasil, aliás, pode ser outra ferramenta importante para lidar com esse perigo de uma nova onda por aqui.

"Será um desafio enorme convocar toda a população para a nova etapa da campanha, mas essa foi a primeira vez que o Ministério da Saúde agiu em vez de reagir [a um problema já instalado]", elogia Maciel.

"Precisamos entender que todas essas medidas - vacinas, máscaras, distanciamento… - adicionam camadas extras de proteção e são essenciais para evitar novas ondas", resume Lima Filho.

E as festas?

Por fim, é preciso considerar os eventos e as datas comemorativas que ocorrem entre o final e o início do ano, como Natal, Ano Novo e Carnaval.

Esses momentos são marcados por festas e encontros entre familiares e amigos, onde há maior risco de transmissão do coronavírus.

Os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil entendem que essas ocasiões representam uma ameaça, mas é difícil pedir que as pessoas continuem em completo isolamento após tantos meses de restrições.

No entanto, é possível pensar em adaptações e cuidados. Entram aqui novamente as recomendações de uso de máscara e a realização de encontros em locais abertos ou com boa circulação do ar.

"E precisamos colocar cada data em contexto. Passar o Natal em família, num grupo reduzido, é muito diferente de comemorar o Réveillon na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, cercado de dezenas de milhares de outras pessoas", compara Bastos.

Embora um pouco mais distante, o Carnaval também já levanta discussões acaloradas, e não há muita certeza de como estará a situação no Brasil no final de fevereiro.

Mais de 70 cidades paulistas decidiram cancelar as festas de Carnaval em 2022 para evitar novos repiques da pandemia© Fornecido por BBC News Mais de 70 cidades paulistas decidiram cancelar as festas de Carnaval em 2022 para evitar novos repiques da pandemia

Ao menos 71 cidades localizadas no interior e no litoral de São Paulo decidiram cancelar as festas do ano que vem, como informa o portal G1.

"É realmente muito incerto o que pode acontecer depois do Carnaval, e o ideal é a gente ter cautela", concorda Bastos.

Considerando que a festa deve ocorrer em muitas partes do país, seria importante que os gestores pensassem em medidas para proteger os foliões e todos os cidadãos, como os comprovantes de vacinação, a realização de eventos em locais abertos, o controle de lotação, a criação de programas de testagem e o uso de máscaras de melhor qualidade.

Albuquerque entende que vivemos novos tempos e não haverá uma "volta ao normal", como conhecíamos o mundo antes de a covid-19 chegar.

"Através da educação, aprenderemos a conviver com o coronavírus e desenvolveremos uma consciência de acordo com a situação de casos, hospitalizações e mortes daquele momento", antevê o pesquisador.

Ou seja: em períodos mais tranquilos, será possível fazer as atividades com menos amarras. Agora, quando os números começarem a aumentar de novo (como ocorre agora na Europa), será preciso adotar medidas mais restritivas.

"Vamos precisar desconstruir a noção de escritório, de ficar oito horas consecutivas numa sala fechada e lotada, de passar seis meses com aulas ininterruptas na escola...", exemplifica.

"A covid mudou a noção de temporalidade do mundo e teremos que nos harmonizar com essa nova realidade."

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